domingo, 13 de junho de 2010

Terapia manual e exercícios para disfunções do ombro?

Do manual therapy and exercises works to shoulder dysfunction?

Doenças do manguito rotador provocam disfunções comuns no ombro e causam dor e perda funcional. Sabe-se que recursos fisioterapêuticos como a terapia manual e programas de exercícios são freqüentemente utilizados para tratar doenças do manguito rotador, mesmo que poucas evidências dêem suporte ou refutem sua eficácia.

Um estudo recente do BMJ 1 (Fator de Impacto= 12,827), constatou que os efeitos benéficos imediatos da terapia manual padronizada combinada com exercícios domiciliares são comparáveis ao placebo em pacientes de meia idade e idosos com doença crônica do manguito rotador após 11 semanas. O efeito benéfico pode aflorar ao longo do tempo, se houver continuidade dos exercícios em casa, e podem ser mais importante para a recuperação da função do que para o alívio da dor.

Tais conclusões poderão render muito debate e questionamentos sobre a eficiência da fisioterapia no tratamento destes problemas, contrariamente a alta frequencia observada destes problemas nos serviços de fisioterapia, onde constatamos que é o segundo problema mais comum tratados nos serviços especializados, após as dores nas costas.

Deste trabalho impecável, metodologicamente excelente, participaram 120 australianos, recrutados entre março de 2004 e novembro de 2007, que foram tratados por 14 fisioterapeutas da área músculo-esquelética, todos com mais de 4 anos de experiência.  Ambas as intervenções duraram de 30-45 min., e foram feitas 2x/sem nas primeiras duas semanas, 1x/sem nas 4 semanas seguintes, e quinzenalmente nas últimas 4 semanas.

Qualquer semelhança com o tratamento empregado no estudo e o que é feito de melhor na prática clínica não é mera coincidência. Foram utilizados recursos manuais como massagem na região do deltóide, mobilizações da gleno-umeral, coluna torácica e cervical, treino de estabilização escapular, bandagem funcional postural e exercícios domiciliares (2x/dia nas primeiras 2sem e depois 1x/dia). O grupo controle foi submetido a ultra-som placebo (10 min.) e aplicação um gel não terapêutico (10 min).

Mas os resultados foram surpreendentes. Ao analisar a eficácia dos tratamentos após 11 semanas, houve melhora significativa em ambos os grupos, sem diferença significativa entre os dois quanto a melhora da dor e da função. A melhora subjetiva referida pelos participantes também não foi estatisticamente significante (42% do grupo ativo versus 30% do placebo – risco relativo de 1.43, com um intervalo de confiança de 95% de 0.87 a 2.34).

No entanto, após 22 semanas de seguimento e realizando apenas exercícios domiciliares, o grupo ativo demonstrou melhora significativamente maior que no placebo quanto a dor, incapacidade, força muscular, interferência nas atividades e qualidade de vida. Porém não foi significativa a diferença entre a melhora da dor ao movimento, ou a satisfação com o sucesso do tratamento.

Durante o período de intervenção, 17/55 (31%) dos pacientes no grupo ativo referiram eventos adversos (dor durante e após a sessão, n=3; piora da dor com os exercícios domiciliares, n=12; irritação com a bandagem, n=2), diferentemente que no grupo placebo, em que 5/61 (8%) pacientes perceberam estes eventos (aumento da dor durante ou após a sessão). Isso pode ter comprometido a mensuração da melhora em curto prazo. Após 11 semanas, 7/49 (14%) do grupo ativo referiu aumento temporário da dor após os exercícios domiciliares.

Os autores ponderaram que a melhora dos dois grupos poderia ser atribuída a evolução natural da doença, uma vez que não houve um grupo comparativo sem tratamento. Tal hipótese não se confirmou ao analisar outros estudos semelhantes. Outro motivo de falta de significância estatística foi o possível efeito placebo, responsável por 30% da melhora em condições de dor crônica, uma vez que ao grupo controle foi proporcionado contato constante com e equipe de saúde, atenção e apoio.

Comentaram também que a inclusão dos pacientes foi feita apenas pelos achados clínicos, o que, nem sempre se equivale ao diagnóstico cinesiológico-funcional (disfunção de movimentos, da função muscular, encurtamentos e alteração da postural escapular e espinhal). Neste aspecto, a ultrasonografia ou a ressonância magnética poderão complementar nosso diagnóstico. Assim, consideram que a conclusão do estudo poderia ser diferente se subgrupos fossem avaliados e tratados diferentemente.

Algumas diferenças puderam ser percebidas ao se comparar o estudo com a prática clínica brasileira. Geralmente, nas disfunções com dor, utilizamos recursos analgésicos (ultra-som, laser, TENS) concomitantemente aos recursos manuais e cinesioterapêuticos, na intenção justamente de melhorar a dor e prevenir este evento. Outra diferença é a freqüência semanal, que geralmente é maior que no estudo. Acreditamos que estas diferenças na abordagem possivelmente mudariam os resultados da pesquisa.

Mas o fato é que, mesmo com a consolidação da fisioterapia para o tratamento das disfunções sintomáticas do ombro, um estudo com resultados tão limitados em um periódico de tão alto impacto pode influenciar na análise crítica da viabilidade do tratamento fisioterapêutico para estes pacientes. Outros estudos se fazem necessários, com certeza!

Referências:
1. Bennell K, Wee E, Coburn S, Green S, Harris A, Staples M, et al. Efficacy of standardised manual therapy and home exercise programme for chronic rotator cuff disease: randomised placebo controlled trial. BMJ. 2010 On line first on 10 jun;340(c2756):1-10.
OBS: Permitido cópia desde que citada a fonte adequadamente.

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